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Como os Comportamentos Digitais Podem Moldar a Comunicação Profissional

  • Foto do escritor: Priscila Z Vendramini Mezzena
    Priscila Z Vendramini Mezzena
  • 24 de out.
  • 5 min de leitura

Introdução

A fagulha para esta reflexão veio de um simples vídeo no Reels.


Uma mulher segurando um lindo filhote de cachorro, com profunda tristeza, disse que precisaria fazer uma doação, pois o marido não havia se adaptado ao animal. O vídeo parecia inocente, e logo a seção de comentários explodiu em críticas, julgando sua atitude. Apenas quem assistiu até o final descobriu a reviravolta: ela estava brincando — a “doação” a que se referia não era o cachorro, mas o marido.


O que me chamou atenção não foi o humor, mas a reação. Muitas pessoas a julgaram — demonstrando claramente que haviam comentado sem assistir ao vídeo até o fim — um reflexo perfeito de como consumimos e reagimos ao conteúdo digital atualmente.


Com o consumo massivo de informações e o ritmo acelerado de vida, tornamo-nos skimmers e scanners — navegando por um oceano de dados com atenção fragmentada, baixa capacidade de concentração e o hábito de rolar telas sem realmente nos envolvermos com o conteúdo.


Essa reflexão vai além do comportamento pessoal. Ela também trata de como esses padrões ressoam em nossas vidas profissionais. Compreender como a atenção funciona e como a comunicação é percebida tornou-se essencial para líderes e profissionais de todas as áreas.


Mesmo que se espere de nós uma postura mais consciente ao lidar com conteúdos profissionais, os mesmos hábitos digitais, reforçados pela dinâmica das redes sociais, muitas vezes nos levam a consumir superficialmente, formar julgamentos precipitados e responder ou compartilhar impulsivamente, sem verificar os fatos ou concluir a leitura.


Afinal, como podemos esperar ser compreendidos se poucas pessoas realmente se concentram em ler ou escutar a mensagem completa?


Comportamentos de Engajamento com Conteúdo e Impactos Profissionais


  1. Como Consumimos Conteúdo

Na era digital, captar a atenção tornou-se um desafio cada vez maior. Com milhões de posts, vídeos e mensagens disputando nosso foco a cada segundo, a atenção tornou-se o recurso mais valioso — e mais escasso.


Pesquisas sobre comportamento digital confirmam que lemos — e assistimos — muito menos do que imaginamos. Nosso cérebro está programado para escaneamento, não para leitura profunda [1].


Esse padrão reflete o sucesso de plataformas como o TikTok, que popularizou vídeos curtos projetados para consumo rápido e engajamento instantâneo. Com o tempo, até mesmo essas plataformas passaram a incentivar formatos mais longos, buscando manter o engajamento (e, claro, a monetização) de um público acostumado à gratificação imediata [2].


Os estudos mostram:

  • A maioria dos usuários lê apenas 20–28% das palavras em uma página da web — eles passam os olhos, em vez de ler com profundidade [1].

  • Poucos chegam ao final: análises do Slate e do Chartbeat revelaram que a maioria dos leitores para por volta de 50–60% do artigo, captando apenas a “essência”, não a história completa [3].

  • A mentalidade TL;DR (“too long; didn’t read” — muito longo; não li) ilustra como o excesso de informação e o ritmo acelerado de consumo estão remodelando a forma como processamos o conhecimento [4].


Possíveis impactos no ambiente de trabalho:

  1. Interpretação incorreta de e-mails, relatórios e atualizações de projeto devido à leitura parcial.

  2. Perda de contexto ou nuances importantes na tomada de decisão.

  3. Pressão sobre comunicadores para simplificar demais as mensagens, arriscando a profundidade estratégica.


  1. Como Processamos e Julgamos Conteúdo

Da mesma forma que consumimos rapidamente, também julgamos rapidamente.


Pesquisas em psicologia social mostram que as pessoas formam impressões duradouras a partir de observações muito breves — um processo conhecido como thin-slicing [5]. Em interações digitais, isso significa que frequentemente reagimos ou julgamos antes que a história completa seja revelada.


A influência dos comentários também é crítica. Segundo Boot et al. (2021, Nature Humanities & Social Sciences Communications), apenas ver comentários positivos ou negativos pode mudar a forma como os leitores interpretam o mesmo conteúdo. Comentários funcionam como “lentes”, moldando a percepção antes mesmo do engajamento [6].


Possíveis impactos no ambiente de trabalho:

  • Conclusões prematuras sobre as intenções ou o tom de colegas (especialmente em comunicações escritas).

  • Aumento de mal-entendidos devido à interpretação emocional ou parcial.

  • Decisões de liderança influenciadas por informações incompletas ou enviesadas.

  • Julgamentos moldados por comentários de terceiros ou respostas impulsivas — como em longas cadeias de e-mails.


  1. Como Compartilhamos

Por fim, observa-se que as pessoas frequentemente espalham informações que não processaram completamente — uma das razões pelas quais a desinformação prospera. Em uma era em que notícias falsas ou manipuladas circulam com rapidez, muitos deixam de verificar fontes confiáveis antes de compartilhar.


Um estudo de Gabielkov et al. (ACM, 2016) mostrou que 59% dos links compartilhados no Twitter nunca foram abertos por quem os compartilhou [7].


Compartilhar, muitas vezes, torna-se um ato de identidade, afiliação ou emoção — mais do que de verificação de fatos.


Possíveis impactos no ambiente de trabalho:

  • Disseminação de informações desatualizadas ou incorretas dentro das equipes, gerando ruído, conflito e decisões equivocadas.

  • Distorção de contexto quando mensagens são respondidas ou encaminhadas sem leitura atenta.

  • Riscos reputacionais para organizações e indivíduos.


Reflexões para Líderes e Comunicadores

Essa breve análise de dados e comportamentos mostra como consumimos e julgamos instantaneamente — e compartilhamos impulsivamente — criando uma tempestade perfeita de ruído nos canais de comunicação, que facilmente leva a mal-entendidos e conflitos.


Como líderes, devemos comunicar com intenção e estratégia — considerando quem é nosso público, como capturamos sua atenção, quais formatos usamos e quão claramente transmitimos a mensagem.


1. Conheça seu público

Entenda com quem está se comunicando — seu contexto, preferências e expectativas. Adapte a mensagem à realidade do público em vez de depender de uma comunicação padronizada.


2. Respeite os padrões de atenção

A atenção é limitada. Estruture mensagens com títulos claros, parágrafos curtos, marcadores e destaques visuais (como negrito). Capture o interesse cedo, mas não troque profundidade por velocidade ou viralização.


3. Escolha o formato adequado

Selecione o canal mais eficaz — texto, vídeo, apresentação ou conversa — de acordo com o propósito e o público. Seja conciso. Evite mensagens desnecessariamente longas (especialmente e-mails). Use visuais — imagens ou gráficos — para aprimorar a compreensão e a retenção.


4. Atenção à frequência da comunicação

Reforçar mensagens e pedir feedback pode ser positivo, mas a comunicação excessiva pode ter o efeito contrário. Evite redundâncias e limite o número de pessoas copiadas em mensagens ou reuniões apenas àquelas que realmente precisam estar envolvidas.


5. Garanta clareza e significado

Adicione contexto quando o tom puder ser mal interpretado, evitando ironia ou humor. Não presuma que o que é evidente para você será evidente para os outros.


Por fim, como público e como membros de equipe, também compartilhamos a responsabilidade:

  • Tenha paciência — leia, assista ou escute até o fim antes de julgar ou responder.

  • Seja cético em relação a reações imediatas — emoção viral não equivale a verdade.

  • Prefira a curiosidade à certeza.


Reflexão Final

Em um mundo de conexão constante e atenção fragmentada, comunicar com intenção é fundamental.Como líderes, nosso desafio é garantir que as mensagens sejam realmente recebidas e compreendidas.


Por outro lado, antes de reagir, encaminhar ou concluir, devemos pausar para ler com atenção, escutar e refletir.


Às vezes, a diferença entre clareza e confusão, entre empatia e mal-entendido, está em apenas alguns segundos a mais de atenção.


Referências

[1] Nielsen Norman Group. (2008; atualizado em 2020). How Little Do Users Read? e How People Read Online: New and Old Findings.https://www.nngroup.com/articles/how-little-do-users-read/https://www.nngroup.com/articles/how-people-read-online/

[2] Shopify Blog. (2025). TikTok Video Length Advice for Your Content.https://www.shopify.com/blog/how-long-can-a-tiktok-be

[5] Ambady, N., & Rosenthal, R. (1992). Thin Slices of Expressive Behavior as Predictors of Interpersonal Consequences: A Meta-Analysis. Psychological Bulletin, 111(2), 256–274.https://courses.media.mit.edu/2004fall/mas921/Ambady%20Rosenthal%201992.pdf

[6] Boot, W. R., et al. (2021). Social Media Comments Bias Perceived News Credibility. Nature Humanities & Social Sciences Communications, 8, 82.https://www.nature.com/articles/s41599-021-00889-5

[7] Gabielkov, M., Ramachandran, A., Chaintreau, A., & Legout, A. (2016). Social Clicks: What and Who Gets Read on Twitter. Proceedings of the 25th International Conference on World Wide Web (WWW '16).https://inria.hal.science/hal-01281190/document



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Priscila Z Vendramini Mezzena

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